Como construir sonhos na garagem

Turbinado, o motor é 1.8, o mesmo que equipava o extinto Santana (Volkswagen). A suspensão, recuperada, é mais antiga ainda, a de uma Brasília (também VW). O chassi foi retirado de um projeto na internet. Assim nascem carros feitos em garagens, construídos por aficionados por automobilismo ou profissionais com alguma atividade no setor. Como uma réplica do Porsche Spyder 1954 , estas máquinas artesanais atraem consumidores interessados em exclusividades, excentricidades ou pura diversão.

Sem nenhuma formação superior, mas com conhecimento prático e teórico, dois amigos de Osasco (Grande São Paulo) decidiram empreender no setor automobilístico. Misto de “faz-tudo” com “Professor Pardal”, David Nunes Araújo e José Donizete montaram há dois anos a Fenix Motors para transformar seus sonhos em realidade. Com economias feitas ao longo da vida, transformaram uma garagem de 50 metros quadrados numa “minifábrica” para montar o primeiro carro, um buggy. Depois veio uma réplica do Spider.

Já estão produzindo a décima unidade, todas já vendidas para empresários, artistas ou profissionais liberais que ficaram sabendo dos veículos pelo boca-a-boca, já que a microempresa não teve nem tempo de divulgar seus produtos. Um buggy é cotado a R$ 35 mil, enquanto a réplica conversível do Porsche sai por R$ 60 mil.

Já há empresas especializadas em vender kits de carros antigos, que, com mais de 30 anos, têm projetos de domínio público e não pagam royalties. Mas é vetado o uso do símbolo e do nome da marca nas imitações – o que as tornaria falsificações. Segundo a assessoria de imprensa da Porsche, as oficinas têm de deixar bem claro que se tratam apenas de réplicas.
“Brinquedos”

Em uma volta pelas ruas centrais de Osasco, o buggy surpreendeu pela força do motor 1.8, reforçado pelo turbo-compressor. A estabilidade e a direção são duras, como usualmente em carrinhos deste tipo mais preparados para caminhos alternativos (estradas não-pavimentadas na zona rural, dunas de praias ou trechos para ralis) que o asfalto.

A falta de conforto é compensada pela sensação de liberdade que um carro com armação tubular e aberto desperta tanto no motorista quanto nos que vêem o buggy circular pelas ruas. É uma diversão, um brinquedinho de fim-de-semana para adultos que querem uma alternativa ao chato dia-a-dia do trânsito monótono da cidade.

Na troca de marcha, percebe-se que o câmbio, assim como o chassi – também tirados de um Fusca e adaptados – suportam os baques dos buracos inesperados da Grande São Paulo. O acesso ao veículo é meio difícil, já que não há portas convencionais. Mas depois de “encaixado” no assento, o buggy começa a aguçar os desejos.

Também com acesso meio complicado – o projeto é de carro pós-Segunda Guerra, a réplica do Porsche Spider dá uma sensação liberdade e nostalgia, quando se tem contato com a direção. Com suspensão tubular, adaptada pela dupla osasquense, o modelo montado no município vizinho da capital paulista atrai elogios em feiras de carros antigos de gente de outros continentes. José Donizete conta que depois de muito olhar, um alemão pediu para a filha dele traduzir. “O estrangeiro disse que a criatividade do brasileiro não tem limites.”

A partir de indicações e muita procura, a dupla de Osasco montou uma rede de fornecedores, que oferece de motores a caixa de seta. Em pequenos negócios, a falta de escala é compensada pelo preço baixo da manufatura artesanal. Mas o desejo é ampliar o negócio, fazendo da atividade, que começa como hobby ou passatempo, evoluir para um verdadeiro business.

Assim como a dupla de microempresários osasquense, pequenos empreendedores quase invisíveis prosperam num gigantesco setor que este ano deverá construir 3,8 milhões de carros no Brasil. Com o crescimento cada vez mais vertiginoso do mercado brasileiro, há uma tendência de surgir mais pessoas interessadas em construir e vender seus próprios carros. Nos Estados Unidos, maior mercado do mundo com a venda de 17 milhões de veículos por ano, vários empreendedores lançam seus produtos, geralmente focados em nichos.

Muita gente com conhecimento nas pistas também empresta seu nome e se envolve com a construção de novos veículos. O piloto Tarso Marques é customizador de motos Harley-Davidson. Ele transforma motos zero-quilômetro em verdadeiras obras de arte, ao entregar para o cliente uma moto personalizada, de design exclusivo.

Além de encontrar novas oportunidades de negócios, pessoas como Marques e os microempresários de Osasco acabam atendendo a desejos de nostálgicos e novos admiradores por máquinas quase surrealistas.
Fonte (Gazeta Mercantil/Caderno C – Pág. 10)(Wagner Oliveira)

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